quinta-feira, 21 de abril de 2011

O Duo - I

A gênese

Linda ela era. Linda mesmo, em todos os detalhes. Mas ela não sabia. E, pro meu desalento, nunca se convenceu disso plenamente. Quando eu a vi pela primeira vez, ainda na escola, eu não passava de um adolescentezinho metido a engraçado, tendo seus primeiros contatos com o mulherio juvenil. Nem barba eu tinha. Não era popular nem rejeitado. Era imberbe e levemente inseguro, como tinha que ser. Ela usava um piercing no nariz, tinha um olhar indescritivelmente charmoso e um ar blasé que só se desfazia quando ela sorria. Puta merda, como eu adorava quando ela sorria. Era a melhor hora do meu dia.

Quando eu me pergunto se Deus existe, eu me lembro que eu e ela tínhamos uma amiga em comum. Na hora e no lugar certo. E, desde então, não ouso ser ateu.

O flerte

Flertar. Taí uma das melhores sensações da vida, em qualquer idade. E infelizmente, algo em que eu sempre fui tão bom e talentoso quanto Bruno de Luca como apresentador. Mas o desastre às vezes é atraente. Nos mostra falíveis, sinceros. Gente. Somos todos gente, no fim das contas. Eram os primórdios do MSN. Em meio a emoticons de gosto duvidoso, CD's gravados com músicas de bandas como Maskavo e Circuladô de Fulô, piadinhas e opiniões sobre tudo e todos, surgiu uma festa. Helloween. Mas era à fantasia.

No dia da festa, arranjei meio às pressas uma roupa listrada escrito 171. "Prisioneiro, que criativo", eu pensei, do alto da minha insegurança. Ela foi de enfermeira. E eu fiquei maluco. Comentei com meus amigos no dia, o que era aquilo?! Cervejas vão, cervejas vêm, eu - que mal sabia beber, assim como ela - tomo coragem, sento no sofá, encosto meu rosto no dela e bam! Remy, do Ratatouille, me entenderia. Nesse dia, eu descobri a diferença entre alegria e felicidade. E nunca mais esqueci. Nunca.

A cabeça

Hora de abrir um parentesis mental aqui, enquanto ouço uma música do Exaltasamba da fase pré-Chrigor. Eu nunca fui dos mais católicos. Nunca tive argumentos sólidos pra defender ferrenhamente a monogamia, por exemplo. Se o cidadão ou a cidadã está insatisfeito(a), porquê não? As leis, a ética, os direitos e os deveres só servem pra reger a sociedade, mas não os relacionamentos. Esses são regidos ao sabor da carne, da alma e da consciência, só. Mas meu ponto é: insatisfeito, eu nunca estive. Meu sangue sempre ferveu com ela. Até demais, mas era bom. É, no fim era bom. Me fazia sentir vivo e diferente, num mundo cheio de gente que apenas existe. Fecha parentesis.

A outra

Nós apenas ficávamos, não tínhamos nada sério. Pelo menos pra ela, não era sério. Pra mim, não era oficialmente, mas deveria virar.

Enquanto isso, no início daquele ano curioso de terceiro colegial, uma outra menina começou a me dar indiretas. Era um xaveco pardo, quase invisível, a não ser pelos olhares que ela me lançava na aula. Lançava não, fuzilava. Até que um dia, ela me diz "poxa, tem um menino da classe de alemão de quem eu gosto muito, mas não vou falar quem é. Você nem desconfia?". Eu gaguejei (virtualmente). Respondi "não sei não", e fechei a janela do MSN. Essa foi a melhor decisão dos meus primeiros 16 anos de vida. Ela era linda, mas não pra mim.

A queda

Obviamente, nunca contei dessa história pra ninguém. Mas fiquei todo meninão, empolgado com essa espécie de aposta ou voto secreto de lealdade que eu dei àquela menina que eu escolhi. Ela, a do piercing. Só faltava eu ser escolhido também. Na minha cabeça, eu tava fazendo tudo certo. Dava mais atenção a ela do que aos estudos, ao futebol, aos amigos, aos meus pais, meu cachorro, todos juntos. E achava isso o máximo.

Um belo dia, sou chamado por ela numa janela do MSN (Bill Gates sempre presente em minha vida). "Ééé, então, eu queria conversar" - eu comecei a suar frio - "acho melhor a gente não ficar mais junto. Gosto muito de você, mas sei lá, vamos dar um tempo. Tá muito sério, eu não tô preparada pra isso". Eu só respondi: "Claro. Ok." Minha vontade era de esmurrar a tela daquele computador até sair sangue da minha mão. Me senti o pior ser humano do mundo. E ali, escorreu uma única lágrima do meu rosto. Uma só.








Nenhum comentário: