quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

O patinho feio, mas bonzinho

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Perder de 6x0 em casa pra um dos seus maiores rivais é algo quase inesquecível. E que, inevitavelmente, leva a muitas mudanças em um clube. A pergunta é: como o Botafogo vai mudar? A questão é mais grave do que parece e mostra ao país do futebol que, sim, é possível um gigante se apequenar.

É consensual que o time de General Severiano tem o mais frágil elenco dentre os 4 grandes do Rio. O fato é que seus rivais estão dois passos à frente na montagem de seus plantéis. E porque isso acontece?

Ao Fogão, pensando exclusivamente no time titular - e com uma dose de boa vontade - faltam pelo menos um zagueiro e um segundo volante. Ao Fluminense da espetacular arrancada de 2009, todos sabiam que faltavam um zagueiro, um lateral esquerdo e um volante com boa saída para o jogo. E o que Cuca - um especialista na montagem de bons elencos - fez? Foi buscar Leandro Euzébio, Júlio César (o melhor ala esquerdo do Brasileirão) e Everton, do Barueri, para 2010.

Mas o buraco é ainda mais embaixo. No futebol, como se sabe, não se é campeão com apenas 11 jogadores. Precisa-se de banco. Suspensões, lesões, punições, convocações, negociações e outros 'ões' podem gerar verdadeiros problemões aos times com elencos frágeis e heterogêneos. O Flamengo de 2008 deu um exemplo claro disso, após as vendas de Souza, Marcinho e Renato Augusto e as subseqüentes apostas fracassadas em Josiel, Vandinho, Sambueza e cia. O próprio Botafogo de 2007, com um time que liderou boa parte do primeiro turno do Brasileirão, provou desse ácido veneno após a suspensão de Dodô, a negociação de André Lima, a punição a Zé Roberto e a simples - e natural - queda de rendimento e acomodação de uma equipe que contava com reservas que não ameaçavam em momento algum a titularidade de ninguém.



Cientes disso, os rivais (dos) botafoguenses utilizam o fim do mês de janeiro apenas para - salvo exceções, como Vagner Love e Elton, que chegam com status de titulares - contratarem reservas e/ou apostas, jogadores para comporem bem seus elencos. É o que o Flamengo faz com Ramon e Michael (dispensado de General Severiano em 2009, por sinal), por exemplo. Tudo isso enquanto o time de Niterói ainda claudica e sofre para fechar seu time-base, algo que, em condições normais, deveria ter feito em dezembro.

E será que esse fenômeno se dá por pura 'falta de planejamento' da gestão de Maurício Assunção, como gostam de simplificar muitos comentaristas? Não creio. Ora, não sejamos míopes. Deve-se entender que o Botafogo está imerso num círculo vicioso, que o imobiliza e o impede de fazer certas contratações. Em outras palavras, é nítido que o clube não está em pé de igualdade com seus concorrentes na hora de ir às compras.

Afinal, em tempos de futebol-negócio, quem quer vir para um clube que não disputa títulos e que sempre começa o Brasileirão cotado para, no máximo, uma Sul-Americana? Por não ser exatamente um clube de massa, a exposição botafoguense na mídia também é menor que a de seus vizinhos. Quer uma prova? Faça um esforço... qual a última grande venda do Fogão? E qual o último atleta que o Alvinegro cedeu à Seleção (não vale a uruguaia)?

O Botafogo está sem crédito no mercado da bola. Paga hoje a conta das irresponsabilidades cometidas por Montenegros, Mauros Neys Palmeiros e afins ao longo dos anos 90 e do início dos anos 2000. Da época de Emil Pinheiro nem vou falar... Mas a questão é ainda maior que isso. Passa pela mentalidade que impregnou General Severiano, pelo complexo de vira-lata que ronda o clube desde a saída de Jairzinho, Quarentinha, Garrincha, Nilton Santos e cia. A lógica do círculo vicioso que aflige o Alvinegro é simples: quanto mais o time perde, menos os jogadores querem jogar lá. Quanto menos os jogadores querem defender as cores do Glorioso, mais o time perde.



Se coloque no lugar de um jogador em ascenção, o Fulaninho Goiano. Os quatro grandes do Rio te propõem um contrato pelo mesmo salário: 30 mil reais mensais. O que você - provavelmente com o auxílio de seu astuto empresário - pensaria?

Possivelmente, algo como "hmmm... no Fluminense, vou jogar por um bom time, com chance de títulos, ao lado do Fred, de uma garotada boa, num time em lua-de-mel com a torcida e patrocinado pela Unimed, que pode me oferecer muito mais numa eventual renovação lá na frente, como fizeram com o Thiago Silva e o Thiago Neves".

"No Flamengo, vou jogar ao lado de Adriano e Vagner Love, no time de maior torcida do país, disputando uma Libertadores, num time bom, ajeitadinho, com intensa exposição na mídia... Qualquer penteadinho novo que eu fizer, já vou virar notícia. Além disso, é um trampolim para a Europa. Ou pro mundo árabe. Aírton, Renato Augusto, Marcinho e Emerson não me deixam mentir"

"No Vasco, tão fazendo um projeto de marketing que, sabe-se lá como, recuperou a credibilidade do clube, que tem boas perspectivas de crescimento em 2010. E, bem ou mal, eles sempre conseguem negociar jogadores com a Europa, como Alan Kardec, Alex Teixeira, Phellippe Coutinho..."

"No Botafogo, hmmm... eu vou encontrar uma administração correta, pés-no-chão, com salários em dia, um estádio grande. Ah, mas o time é ainda muito fraco e a torcida é uma das mais frias e descrentes do país. É... acho que é só isso que eu vou encontrar mesmo"



É. Tem uma comunidade no Orkut bastante popular entre os jovens namoradeiros que diz: 'bonzinho só se fode'. O Botafogo é bonzinho.