terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Daqui a 10 anos

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Numa aula de Celso Cruz, certa vez, nos foi perguntado o que imaginávamos do mundo daqui a 10 anos. Minha resposta foi boba, mas a pergunta ressoa quase todos os dias na minha cabeça. Aqui está o que eu diria hoje...

Falso otimismo. Catracas, cada vez mais catracas. Muros, guaritas, vigias, seguranças, grades, fechaduras, celas, blindagens, travas, câmeras, arames, cães-de-guarda e senhas. Códigos. Muitas tribos, mas não aquelas que agradariam Darcy. Essas estarão extintas, como hoje já estão - civilizadas e domadas por aí. As tribos do futuro serão movidas por uma pretensa necessidade de distinção, embora tenham muito pouco a dizer e, entre si, no âmago de sua rebeldia comportada, se pareçam muito. Pouco acrescentarão à humanidade e darão apenas novos nomes à futilidade.



Novelas. Às 3, às 6, às 7 e às 9. E programas sobre novelas, no almoço e no jantar. E Ídolos postiços e uma indústria toda montada acerca deles, que, por sua vez, se revezam no estrelato. Falsas polêmicas que alimentam discussões de senhoras decrépitas e desocupadas, cuja inocente contribuição para o ciclo narrado merece menção honrosa.

Publicitários a rodo. Pouquíssimo conhecimento, mas um vasto domínio das possibilidades do "mercado". Ser antenado e ligado nas tendências vai virar profissão. E diferencial. Conceitos se tornarão manipuláveis e o boca-a-boca será a principal ferramenta de divulgação de frases sem sentido, que supostamente exprimem idéias. Ou seja, cerveja.



No futebol, os laterais serão cada vez mais altos e menos ágeis. Serão zagueiros, a bem da verdade. Pouco a pouco, os pontas vão voltar. Hoje, ainda estão disfarçados de segundos-atacantes. Os antigos camisas 10, cada vez mais raros, darão lugar a um tipo 'moderno' de atleta: o 8. O cérebro do time deverá ser também um marcador. Hernanes, Gerrard, Lampard e Xavi não me deixam mentir.



Clubes-empresa terão as rédeas do negócio. Jogadores fatiados, nas mãos dos mais variados tipos de especuladores, atravessadores e aproveitadores. Tudo, claro, em nome da emancipação dos atletas. Claro, claro...

Na primeira divisão, metade dos clubes será paulista (afinal, somos a locomotiva do Brasil, meu!). Desses, 50% não terão jamais tradição alguma, mas serão vitaminados por pools de empresários e prefeituras por aí. Servirão de vitrine e trocarão de elenco como quem troca de roupa. Ou seja, os clubes - será que só eles? - reconhecerão sua mediocridade e se limitarão ao subserviente papel de trampolim. Trata-se da classe média da bola, que chega para ficar.



A arte, como em toda crise, florescerá. Com a 'democratização' das mídias, contudo, qualquer merda vai ser tida como arte. Picaretas se afirmarão e serão aclamados por boa parte da mídia 'especializada'. Essa chancela vale ouro.


Na categoria "extintos", além de índios, laterais e diversas espécies de animais, estarão as opiniões. Sim. Pensar vai ser artigo raro nas prateleiras, já que dá preguiça. Vai ser melhor mesmo ouvir qualquer homem de terno com um livro debaixo do braço por aí professando a sua, a nossa e a vossa fé em qualquer entidade superior e acreditar que se é brasileiro, e por isso não se deve desistir nunca (ah, os publicitários!); do que reclamar o que é seu. É melhor porque é mais fácil.

Quem for contra a maré, logo vai ser acusado de retrógrado, ranzinza, comunista (?) ou algo do gênero. Os argumentos, claro, serão evasivos; mas a rejeição será eterna e até merecida àqueles que buscarem explicações frente a um quadro de ponta-cabeça.

A educação, como é conveniente, será sucata - como já é há 4 décadas - e o dito 'ensino de qualidade' (tem cabimento uma expressão dessas?), que é voltado a ensinar os jovens a enriquecerem ou administrarem as riquezas 'conquistadas' por seu clã, vai estar nas mãos de pouquíssimos e privilegiadíssimos. Mas acredite, vai ser um investimento correto e certeiro.



As cartas já estão marcadas e não precisa ser Mãe Dinah pra prever o futuro. Não tem nem graça. O futuro é uma grande punhetinha juvenil, mas só quem vão gozar são uns poucos. O resto? Ué, o resto é impotente.
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terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Navidad

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24 de dezembro, 8 da noite, São Paulo.

Véspera de Natal. Pernil, família e champagne à espera.
Era hora de se arrumar. "Vai tomar banho, filho", dizia a mãe, apressada. Eis que relâmpagos interrompem o fluxo da casa. Trovões, trovoadas, ruídos, rugidos celestes. A bem dizer, com o perdão da aliteração, era barulho pra caralho e agora, só agora, ninguém ouvia ninguém. Tem início uma chuva armagedônica e o banho ficou pra depois. Olhos na rua. O cachorro, que mais parece um lobo, baixa o rabo e fica amoado. Barulho demais, demais...

A rua inundada abriga carros que lembram o tal lobo da casa: perdidos, com medo de serem levados, se prendem ao meio-fio como suicidas ao parapeito. Peito. O filho lembra de beber algo, mas na geladeira só tinha leite, a bebida que ele mais detesta. Vai água mesmo, então. E isso era o que não faltava naquele início de noite.

Olhos de volta à janela. A sensação era de que aquilo era breve e passageiro e de que, acontecesse o que acontecesse, estariam lá no conforto da família à meia-noite. Afinal, aquele pernil gorduroso - que um dia teve vida - precisava ser devorado. Assassinos!

Assassinos porra nenhuma... Eram pessoas boas. Conscientes. Descontentes, insatisfeitas, brigadoras, críticas. E que valorizavam a família, bem mais que a tradição e a propriedade. Qualquer sacrifício era válido, pois.

Eis que na rua escura, em meio à enchente, brota Zé. Sim, não é licença poética, o nome dele é Zé. O mal-pago vigia da praça. Encharcado, o solitário Zé buscava abrigo na sua guarita, a um quarteirão dali. E todos da família se olharam, mesmo que só em pensamento. Não havia uma única palavra a ser dita. Dizem que o Natal é época de compartilhar. E foi isso que fizeram... dividiram o mesmo lamento. Um estranho e forte sentimento de culpa se fez presente.

E passaram o Natal à luz de velas.

Talvez algum escritor germânico explique. Quem sabe?

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Imobiliza-me

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Esse mini-crítico não consegue parar de pensar em você. E quando isso acontece, eu fico estupidamente imóvel. Preciso tomar uma atitude. Ou não. Ou sim.

E aí me vem: por um lado, eu fico com uma certa tranqüilidade pela certeza de que, no fim das contas, aconteça o que acontecer - armageddon, aquecimento global, derretimento de calotas polares, terceira guerra, volta dos dinossauros ou simplesmente tudo como está - eu vou estar com você. Por outro, eu fico ansioso e triste pela sua ausência. São as tais persianas clichezadas, que não filtram a poeira dourada, de que Samuel Rosa já me avisava há mais de década. Minha casa não tem nem persianas, mas eu sinto.

E quer saber, mina? Essas coisas, a gente vê pelos detalhes. Não é pelos 'eu te amos' espalhados mundo afora, como se fossem adesivos de propriedade, não é pelas notas fiscais cheias de zeros dos presentes de natal. Não é.

Eu gosto de levar bronca da minha mãe quando aviso em cima da hora, nas sextas depois da aula, que vou pra sua casa e sou obrigado a parar o carro na rua. Gosto de como você me zoa quando eu vou pedir uma pizza ("Éééé... oi... boa noite... eu.. ééé.. eu queria fazer um... um pedido.. pode ser?"), de quando a gente aluga um filme. O filme pode ser uma bosta, mas a sua companhia vale minha noite, meu dia, minha semana. Vale minha vida, menina. Minha vida.



Aí chega hoje, uma sexta feira e não vou ter isso.

Você é inquilina do meu pensamento. E eu, imóvel que sou, nunca vou te despejar.

P.
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quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Fullgaz

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O sucesso, no Parque São Jorge, é um elemento químico mais volátil que álcool.
O álcool, por sua vez, é responsável pela volatilidade de muitos (in)sucessos alvinegros.

Aqui vai um time com 149 efêmeros talentos para os corinthianos fanáticos se deleitarem:

Goleiros:

Ricardo Pinto, Yamada, Renato, Rubinho, Nei, Maurício, Sílvio Luiz, Johnny Herrera, Jean, Jônatas



Laterais-direitos:

Edinam, Fábio Augusto, André Santos, Edson, Tamandaré, Carlos Roberto, Índio, Daniel Martins, Ayupe, Villamayor, Rodrigo, Ângelo, Iran, Vitor, Amaral, Pedro Silva, Diogo, Denis



Zagueiros:

Marquinhos, Gralak, Marcus Vinicius, Scheidt, João Carlos, Capone, Alexandre Lopes, Gino, Ávalos, Cristian Suarez, Sangaletti, Luciano, Valdson, César, Marcelo Magalhães, Zelão, Kadu, Valença, Fabio Braz, Gustavo, Fábio Ferreira, Jean, Diego



Laterais-esquerdos:

Edson Canhão, Augusto, Fininho, Moreno, Julinho, Creisler, Ronny, Roger, César, Wellington, Everton Ribeiro, Wellington Saci



Volantes:

Otacílio, Pingo, Romeu, Márcio Costa, Bóvio, Cocito, Gallo, Pereira, Careca, César Sampaio, Djair, Rodrigo Pontes, Wendel, Moradei, Ricardinho, Daniel Paulista, Paulo Almeida, Rafael Fefo, Perdigão, Carlão, Túlio



Meias:

Lecheva (à época, Ricardo Mendes), Lindomar, Deco, Assis, Edson Di, Elton, Andrezinho, Luciano Bebê, Jorginho, Fernando Diniz, Luis Mário, Fábio Baiano, Samir, Adrianinho, Piá, Rodrigo Beckham, Fumagalli, Robert, Heverton, Aílton, Marco Antônio Boiadeiro, Koichi, Diogo Rincón, Marcel, Acosta, Rafinha, Eduardo Ramos, Marcinho, Marcelinho



Atacantes:

Tiba, Donizete Pantera, Alcindo, Frank Williams, Gilmar Parrudo, Santiago "El Tanque" Silva, Daniel Grando, Rafael Akai, Neto, Ferreti, Bobô, Abuda, Wilson, Jamelli, Clóvis, Alex Rossi, Agnaldo, Renaldo, Régis Pitbull, Amoroso, Paulo Nunes, Leonardo, Rafael Silva, Marcelo Ramos, Leandro Amaral, Edson Pelé, Lucas, Junior Negão, Clodoaldo, Jaílson, Christian, Jean, Lima, Henrique, Bill

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Reinventa-te, futebol carioca

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Em 2008, pelos verdejantes relvados latino-americanos, o futebol carioca proporcionou alguns lampejos do que já representou um dia. Como de praxe, contudo, o fim do ano serve para fazer ecoarem as chacotas de paulistas e cia., que propagam seu bairrismo mundo-da-bola afora ao gargalharem dos infindáveis fracassos das agremiações fluminenses em quase todas suas empreitadas esportivas.

É bem verdade que o Flamengo usou o ano para consagrar uma espinha dorsal competente, formada em 2007, que conta com dois alas ultra-ofensivos, uma confiável e experiente dupla de zaga e, na meia, um talentoso prata-da-casa, como reza a tradição rubro-negra.

Não é mentira, também, que o Fluminense viveu seu sonho de uma noite de verão, ao fazer uma respeitabilíssima campanha na Libertadores, torneio em que não tinha tradição alguma.

E que atire a primeira pedra aquele que não reconhecer que, em General Severiano, quem sobressaiu foram dois técnicos. Cuca, que mais uma vez mostrou seu dom em montar bons times sem gastar quase nada; e Ney Franco, que, com sua franqueza, levou o elenco alvinegro a subir feito foguete no Brasileiro, depois de um preocupante marasmo.

Mas o que fica na retina é o inédito rebaixamento cruzmaltino. Time das goleadas. Time - e clube - em frangalhos, endividado até as tripas. Time que, por isso, perderá o pouco capital humano que conseguiu arrecadar em 2008. Haja trabalho para Dinamite...

Como esquecer o fiasco flamenguista na Libertadores, na festa de despedida do Papai Joel? Convidaram o guloso Cabañas e, devo dizer, ele se esbaldou e deu até prejuízo. E só de pensar que ainda há quem menospreze o talento do artilheiro paraguaio... Veio Caio Júnior e quase nada mudou. Um bom início no Brasileirão, como todos estão carecas de saber, implica na perda de alguns jogadores na janela de transferências. O Flamengo, talvez por não ter se visto nessa situação com muita freqüência nos últimos tempos, foi amador ao lidar com a perda de seu ataque. Por isso, perdeu a chance de brigar pelo título. E no fim do ano, com direito a um inexplicável oba-oba de Márcio Braga e seus asseclas, o time colecionou fracassos na reta final do Brasileirão e ficou de fora também da Libertadores.

O Fluminense, no início de 2008, prometia um timaço. Era essa a palavra do hoje desempregado Branco, sustentada pelos muitos reais da Unimed de Celso Barros. O clube, então, fez como seu ex-coordenador de futebol nos Estados Unidos, em 94: foi às compras. Montou, de fato, um bom time. Mas não um elenco. Como resultado, após a perda da Libertadores, o Tricolor viu-se claudicante no Brasileiro, tendo acumulado pouquíssimos pontos enquanto jogou com o time B.




E a regra "após toda e qualquer campanha de destaque no primeiro semestre, vem o assédio dos europeus, famintos por pé-de-obra barato e talentoso" não foi levada muito a sério nas Laranjeiras. Na barca, levaram para o Velho Mundo Thiago Neves, Cícero e Gabriel. Como no caso do Flamengo, esse assédio não era esperado. A reposição, além de ter demorado, não foi à altura e o time só escapou do rebaixamento graças ao esforço de outros clubes, que "foram merecedores" - para usar um termo da moda; e ao bom trabalho motivacional de René Simões, que, em vez de afirmar que o Fluminense iria brincar no campeonato, convenceu o elenco de uma verdade irrefutável: o Tricolor tinha mais time que, pelo menos, mais dez integrantes da Série A.

O Botafogo, por sua vez, traçou planos mais modestos que os rivais. Cuca começou o ano montando um elenco que atraiu expectativas quase nulas. O time formado era, de fato, limitado. Mas funcionava como uma engrenagem, tinha toque de bola envolvente e, principalmente, demonstrava uma entrega notável - ingrediente que esteve em falta nas prateleiras alvinegras em 2007. Com a perda do título carioca e a eliminação nas semi-finais da Copa do Brasil, Cuca caiu. A mágica se desfez. A campanha no Brasileiro era fraquíssima e o trabalho de Geninho não surtia efeito. Chegaram Ney Franco e Carlos Alberto e o que parecia improvável aconteceu. O time ascendeu na tabela e voltou a mostrar a velha motivação. Eis que veio uma nova eliminação na Sul-Americana e, de repente, um vazio. As dívidas cresciam, o Engenhão passou a ser visto como um elefante branco, o plantel - outrora barato - passou a ser visto como caro e as perspectivas em General Severiano eram negras. Montenegro, que nunca se preocupou muito com seu ibope no elenco, meteu a boca no trombone, acusou Deus e o mundo e o ano, do nada, acabou. Todo o trabalho feito nesse ano foi jogado no lixo por um Botafogo que, embora tenha acertado ao renovar com Ney Franco, parece se encantar com o mito de Sísifo.

Agora, em meio às reformulações dos escretes cariocas, é interessante observar o perfil dos contratados (e suas medidas extra-campo, claro) e ver se os clubes realmente aprenderam com seus - muitos - erros. Afinal, jogadores como Beto, Ailton, Ramon, Petkovic, Edmundo, Romário, Bebeto, Jorge Luis, Válber, Pimentel, Djair, Pingo, Alexandre Torres, Wilson Gottardo, Donizete Pantera e Leandro Ávila estão apagando cada vez mais velinhas. Muitos deles já se aposentaram e são vistos nas quadras de showbol.



E é aí que eu me pergunto: a quem recorrerão os cariocas? Será que a mentalidade mudou? A "filosofia de trabalho" - como gosta de dizer o 'pofexô' - acompanhará os novos tempos desse negócio chamado futebol ou o esporte do Rio continuará marcado pelo risível amadorismo de sua administração? Aguardemos 2009.
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