terça-feira, 11 de maio de 2010

12 homens e um degredo

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Em muitos assuntos, Dunga se mostra incompreensivelmente intransigente e se esconde atrás do 'gosto não se discute' e de seus resultados. Noutros tantos, a opinião pública - guiada pela sempre maleável imprensa brasileira - é que parece vir pronta de fábrica e ser incapaz de fazer qualquer análise racional, ou seja, baseada em fatos e argumentos. Em meio a esse tiroteio de teimosia, introduzi meu bedelho na lista do professor guerreiro e selecionei os 12 nomes mais controversos para opinar.

Doni
A implicância com Donieber começou quando ele era goleiro do Corinthians, entre 2001 e 2003, muito mais por sua cara de banana do que pelo mau futebol. Até porque aqueles que se derem ao trabalho de pensar se lembrarão que Doni teve uma boa passagem pelo Parque São Jorge - onde tradicionalmente se vai do céu ao inferno em questão de segundos. Nas poucas oportunidades que teve na Seleção, o goleiro foi bem. Na Roma, onde perdeu a vaga por contusão, também. Mas, com Victor e Fábio na boa fase em que estão, sua convocação não se justifica, afora o fato de ser arriscado contar com um arqueiro que nem sequer jogando está.

O que me chama a atenção é a constatação de que muito da perseguição a Doni vem do clubismo (velado mas indisfarçável) de diversos formadores de opinião. Não raro, vemos gente diplomada e com salário em dia cobrando na TV e nos jornais a convocação de Bruno, do Flamengo, e Felipe, do Corinthians - dois dos maiores exemplos de inconstância do futebol brasileiro. Doni pode não ser excepcional tecnicamente (como também não o são Bruno e Felipe), mas tampouco é irregular.



Gomes
Mesmo em suas melhores fases, Gomes cometeu falhas infantis e inesquecíveis. Assim como Helton, o goleiro do Tottenham tem sua carreira marcada por uma irregularidade impressionante. Certamente, não seria meu escolhido para a Seleção. Mas a boa fase pelo clube e o jeito boa-praça contaram e lá vai Heurelho Gomes embarcar para o inverno africano, mesmo sabendo que dificilmente será aproveitado.




Michel Bastos
Ainda jovem, esteve presente no rebaixamento do Grêmio em 2004. Em seguida, o então lateral-esquerdo foi para o Figueirense, onde explodiu, com suas cobranças de falta venenosas e seus chutes fortes. No futebol francês, logo virou meia-direita, e dos bons.

Dos mais de 6 bilhões de habitantes do planeta, só Dunga e Jorginho ainda o vêem como um lateral. O resultado são atuações tímidas, que tolhem o talento do jogador. Antes optasse pelos abusados Diego Renan e Marcelo ou, vá lá, pelo discreto (mas experiente... e lateral-esquerdo) Roberto Carlos. Mas o conservadorismo venceu. E onde já se viu conservadorismo arriscado? Welcome to Dungaland.

Gilberto
Há pelo menos 6 anos, desde que deixou o Grêmio para jogar no São Caetano, Gilberto é um competente meia-armador. Mas, a exemplo de Parreira em 2006, Dunga enxerga o atleta cruzeirense como um lateral. Jogando na posição, Gilberto sempre foi discretíssimo, mas seguro. Não encanta, mas também não compromete. Bem a cara do time de Dunga.




Gilberto Silva
Grande surpresa da lista da Copa de 2002, Gilberto Silva venceu a desconfiança geral e fez um torneio perfeito, amparado pelo esquema com 3 zagueiros. Desde então, nunca repetiu o bom futebol, o que nos leva à óbvia constatação de que aquele ótimo desempenho era a exceção, e não a regra.

Apesar de útil nas bolas aéreas, o volante mineiro é muito lento e joga um futebol no mínimo feio. Não pelos chutões - algo que, justiça seja feita, não faz parte de seu repertório - mas pelos passes de lado, por jogar de cabeça baixa e por pensar pouco com a bola no pé (exatamente o oposto do santista Arouca, por exemplo).

Fica a sensação de que Dunga projeta sua imagem em Gilberto Silva, sonhando em reler a manchete: 'jogador execrado na Copa anterior dá a volta por cima e cala a bola dos críticos'. Ah, a vaidade...

Felipe Melo
Contrariando todos os prognósticos, o volante foi se firmando no meio-campo da Seleção. Sua entrada no time coincidiu com o melhor momento da era Dunga, com vitórias convincentes sobre potências em crise como Itália e Argentina. E não é por acaso. Felipe Melo costuma ir muito bem com a camisa amarela, marcando muito bem e conduzindo (às vezes demais) a bola pela esquerda até entregá-la para Robinho ou Kaká.

O problema é sua péssima temporada na Juventus, somada a seu nítido descontrole emocional, que o fez ser expulso várias vezes. Tudo isso, no entanto, seria esquecido por boa parte da imprensa se Melo não tivesse a fama de mala que tem. No frigir dos ovos, sua convocação é justa.

Josué
Os irascíveis críticos que apontam Josué como símbolo de uma era de mediocridade na Seleção se esquecem de dois jogos-chave de grau máximo de dificuldade em que o pernambucano foi muito bem e, por isso, ganhou a confiança de Dunga. Contra o Uruguai (2x1 de virada - conseguida após a entrada do volante na equipe) e na final da Copa América de 2007 contra a favoritíssima Argentina (3x0, com Josué sendo eleito o melhor em campo após anular ninguém menos que Lionel Messi). Em ambas as partidas, o baixinho foi escalado em sua função de ofício: primeiro volante. Ali, poucos combatem como ele, que em seu segundo ano de futebol alemão já ganhou a braçadeira de capitão e contribuiu muito para que o modesto Wolfsburg fosse campeão da Bundesliga pela primeira vez. Tudo isso sem distribuir pancadas, como por exemplo Mascherano sempre fez. Coisas que curiosamente não se ouve em nenhuma discussão de boteco nem nas mesas-redondas. Nessas horas, vemos a falta que um cabelo melhor, um porte físico britânico e uma boa assessoria de imprensa fazem.



Kléberson
Foi a partir da entrada de Kléberson que o 3-5-2 de Felipão começou a funcionar e o Brasil arrancou para a conquista da Copa de 2002. Desde então, o volante/meia acumulou fiascos por Manchester United e Besiktas, até parar no Flamengo, onde atualmente é reserva de Vinícius Pacheco.

Em 2 anos de rubro-negro, Kléberson fez apenas duas partidas realmente inesquecíveis. Na goleada sobre o Palmeiras pelo Brasileirão 2008 e semana passada, quando entrou no intervalo e mudou o jogo das oitavas-de-final da Libertadores, contra o Corinthians. A experiência e o já empoeirado currículo falaram mais alto e pode ser até que Kléberson faça uma ótima Copa do Mundo. Mas isso não significa que ele tenha feito o bastante para estar lá. Thiago Motta, Elias e Hernanes, por exemplo, apresentaram muito mais futebol nos últimos 3 anos.

Ramires
No Cruzeiro de Dorival Junior, Ramires começou como primeiro volante (tendo Léo Silva como parceiro). Com Adílson Batista, passou para terceiro homem de meio-campo e viveu a melhor fase da carreira. Mas seu futebol foi murchando gradativamente, até chegar na atual má fase. Na Seleção, fez duas boas partidas (ambas na Copa das Confederações), algumas medianas e outras simplesmente abaixo da crítica, com a bola queimando em seu pé. Por muito menos, Ronaldinho Gaúcho (que joga em outra posição, diga-se) foi descartado. Mas Ramires é 'guerreiro', não gosta de samba e não é fotogênico, então vai com nós.



Elano
A liberdade e o bom futebol de Maicon só são possíveis pela presença de Elano. Não só pela cobertura defensiva que oferece, mas pela movimentação inteligente e pelo ótimo passe. Pare para pensar: qual a porcentagem de gols do Brasil que passa pelos pés de Elano? Não é pouca.

Aliás, o exemplo do bom meia do Galatasaray escancara uma bisonha confusão muito comum na cabeça de significativa parcela dos jornalistas e torcedores: a diferença entre técnica e habilidade. Elano tem ótima técnica, mas não tem habilidade, não é veloz nem parte para cima dos marcadores. Denílson, por exemplo, sempre foi o oposto. Convocação (e titularidade) justíssima.

Júlio Baptista
Outro ícone pejorativo da Seleção de Dunga, perseguido muito antes de esquentar o banco da Roma. O que seus críticos esquecem é que, quando requisitado, Julio Baptista foi muito bem.

Particularmente, não tenho dúvidas de que Ganso é o reserva certo para Kaká. Mas não é absurdo algum apostar num jogador que já demonstrou personalidade com a camisa da Seleção em diversas situações de pressão. Pelo contrário, ignorar sumariamente uma virtude tão rara seria uma demonstração de irresponsabilidade do técnico. E pela versatilidade mostrada ao longo da carreira, Júlio poderia muito bem ser convocado para a reserva de Elano, apesar de (tal qual Ramires) possuir características muito diferentes das do camisa 7 de Dunga.

Grafite
Há tempos, Grafite merecia ao menos uma chancezinha na Seleção, que já teve Jô, Bobô, Vágner Love, Rafael Sóbis, Afonso Alves e Amauri convocados. No modesto Wolfsburg, o atacante fez chover e, ao lado de Benaglio, Josué, Misimovic e Dzeko, levou o time ao inédito título da Bundesliga, com direito a artilharia, recordes de gols e tudo mais. Um feito e tanto.

Tardou, mas recebeu a oportunidade - mesmo que tenha sido quando já não vivia uma fase tão brilhante como a do ano passado. Com a camisa amarela, foram míseros 26 minutos muito bem aproveitados. Uma assistência para Robinho e uma certeza na cabeça de Dunga: no esquema atual, para aproveitar os cruzamentos de Elano e Maicon, é preciso ter um centroavante de força física, jogando como referência.

Luís Fabiano, companheiro de Grafite no São Paulo em 2004, é titular incontestável para exercer a função. Adriano era o 'reserva absoluto' até conseguir a proeza de queimar seu filme com o técnico, que parecia lhe dar interminável crédito.

A vaga então sobrou para Grafite, claro. E, dentro dos questionáveis critérios adotados nos últimos 4 anos, é justa a convocação. Por suas características (e pelo jeito Dunga de se ver futebol), é mais do que óbvio que Neymar competia com Nilmar e Robinho por uma vaga, e não com os definidores Luis Fabiano, Adriano e Grafite.



Em suma, 5 jogadores receberam minha insignificante mini-aprovação (Josué, Felipe Melo, Elano, Júlio Baptista e Grafite). Os outros 7, não. Mas eu não sou Dunga e nem quero ser. Tô bem aqui comendo meu Doritos.